Sobre muletas e o medo de não voltar a pedalar


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Eu nunca pensei que um dia seria impedido de pedalar por conta de dores nas pernas ou qualquer outra questão de saúde, mas isso aconteceu entre Fevereiro e Março de 2018, quando retornei ao Brasil depois de uma viagem pela Índia. A foto acima tem um significado muito importante em todo processo, foi a primeira vez que usei muletas na vida e o dia que consegui sair para cortar cabelos, fazer a barba e almoçar no meu boteco preferido.

Quando as dores começaram, procurei meu ortopedista, Dr. Renato Brunharo, que ao examinar as pernas atestou que não via nada ali para justificar as dores. Nesse momento já havia feito exames que atestaram que não era trombose e Dr. Renato encaminhou meu caso para uma neurologista.

Agora corta pra mim, câmera na minha cara, foco no amiguinho que vou te contar uma faceta da minha personalidade.

Eu não tenho facilidade em pedir ajuda, não tenho. Moro sozinho, lavo, passo cozinho, me viro bem. Imagina aquele garoto que assistiu todos os filmes do Rambo, as série do Magaiver – eu escrevo assim mesmo pois tem valor afetivo pois fui aquele moleque que escrevia as letras de músicas em inglês do jeito que ouvia na rádio, eu queria cantar “aiuananou, raveiuseinderein” e naquela época não tinha Internet, Google… então você sabe, Rarison Ford, Maicon Jaqson era meu mundo.

Volta pra Fevereiro de 2018, estou em casa, na rede, dores nas pernas cada vez mais fortes mas eu sigo firme, sozinho, com meus gatos, com fé de que em poucos dias estaria pedalando, trabalhando, vida no ritmo normal. Mas não foi isso que aconteceu, um evento marcante me obrigou a buscar ajuda.

No chão da cozinha, sangue na testa e a constatação de não ter chegado a tempo ao banheiro.

Era madrugada e acordei com vontade de ir ao banheiro. Eu tenho hábito de beber bastante líquido, de 2,5 a 3 litros por dia, e às vezes preciso esvaziar o tanque na madrugada. Tive muita dificuldade para sair da cama pois minhas pernas estavam quentes, doloridas e como num movimento de capoeira me lancei até ficar de pé e começar a caminhar até o banheiro, que naquela época, era preciso atravessar a casa e passar pela cozinha.

Ao chegar na cozinha, percebi que se não acelerasse o passo e desse uma leve corridinha não alcançaria o banheiro no tempo desejado da minha vontade. Então lá fui eu, acelerei mas derrapei na curva, minhas pernas não responderam ao meu comando e fui de cara no chão. Lá estava o cara super independente, que resolve tudo sozinho, com a testa sangrando e o pijama mijado. Nocaute! Chorei.

Primeira vez que usei muletas na vida.

Depois da queda, pedi ajuda. Avisei algumas pessoas sobre meu estado, tive cuidado de vizinhos e passei um tempo na casa da minha família. Foi minha mãe que alugou as muletas, eu não queria que ela me visse de muletas, na real eu não queria admitir tudo o que estava acontecendo e reconhecer o medo avassalador que estava sobre mim.

Depois de uns dias de cuidado da família, voltei pra casa pois estava pra chegar um amigo que havia passado para mestrado no Rio e ficaria uns dias na minha casa até conseguir alugar um espaço. Solano, de Maringá, não veio por acaso. Ao chegar em casa fiz uma intervenção no espelho do banheiro, colei uma frase e pendurei essa figura aí da foto. Mas essa história eu conto no próximo texto.

Se você chegou aqui agora e caiu direto nesse texto, vou te explicar resumidamente. Este é o terceiro texto de uma série que comecei a escrever sobre minha viagem pela Índia em 2018. Se tiver curiosidade, eis os links:

  1. Índia, suas conexões e o medo de viver
  2. O medo me parou
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